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As “Commercial Papers” como instrumento de captação de recursos pelas startups

Os valores mobiliários são instrumentos de capitalização amplamente utilizados pelas Sociedades Empresárias Anônimas, previstos formalmente pela Lei 6.404/76 e reconhecidos pela Lei 6.385/76, pela grande importância no fortalecimento do mercado e das instituições responsáveis pelo desenvolvimento econômico do país.
Nesse sentido, a compreensão do perfil e características de cada espécie de Valor Mobiliário permite não apenas sua diferenciação, mas condiciona uma melhor decisão na captação pública ou privada de recursos financeiros para companhias abertas e fechadas, dentro do Mercado de Valores Mobiliários.
Esses “papeis”, quando emitidos nos termos da Lei 6.385/76 passam a ser regulados por normativas administrativas próprias de competência regulatória da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), sujeitando-se a especificidades que dão segurança ao mercado e aos investidores que os adquirem.
Como exemplo, tem-se a Nota Comercial prevista no inciso VI, do caput do art. 6.385/76 como espécie de Valor Mobiliário “recentemente” regulamentada pelo art. 45 e seguintes, da Lei 14.195/2021, cuja emissão passou a ser expressamente autorizada para as Sociedades Limitadas e Cooperativas.

Art. 46. Podem emitir a nota comercial as sociedades anônimas, as sociedades limitadas e as sociedades cooperativas.

A intenção por traz da referida lei foi estabelecer pressupostos que asseguram a legalidade e conformidade no uso desse instrumento de dívida (Valor Mobiliário) por sociedades de pequeno porte, tais como startups, a fim de permitir que potenciais investidores ingressem com capital de risco, porém, mediados por instrumentos financeiros mais qualificados e que lhes autorizem a conversão em participação societária.
Contudo, a despeito da legislação atual, especialmente a Lei Complementar nº 182 (marco legal das startups), que lista uma série de instrumentos de investimentos em inovação e prevê, dentre eles, as debêntures (títulos normatizados e Valor Mobiliário típico), sua emissão não se dá livremente por sociedades limitadas, dependente que está da qualificação da emissora como Sociedade Anônima.

Art. 5º As startups poderão admitir aporte de capital por pessoa física ou jurídica, que poderá resultar ou não em participação no capital social da startup, a depender da modalidade de investimento escolhida pelas partes.
III – debênture conversível emitida pela empresa nos termos da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976;

Visto isso, para aquelas sociedades empresárias que desejavam emitir um instrumento típico do Mercado de Capitais, inegavelmente mais atrativos pelo formalismo da regulação própria e mais indicados para captação de investidores qualificados, tal barreira regulatória impedia que sociedades limitadas usufruíssem dessa modalidade de instrumento financeiro.
Dito isso, diante da expressa previsão contida na Lei 14.195/2021 que estabelece a possibilidade de que Sociedades Limitas e cooperativas também emitam Notas Comerciais, sendo que, no caso das Limitadas, esses títulos de créditos poderão ter caráter de conversibilidade em participações, modifica-se o cenário de acesso o capital especulativo.

Art. 51. Nas distribuições privadas, o serviço de escrituração deverá ser efetuado em sistemas que atendam aos seguintes requisitos:
§ 2º A oferta privada de nota comercial poderá conter cláusula de conversibilidade em participação societária, exceto em relação às sociedades anônimas.

A questão que se coloca em discussão é qual o real alcance desses Valores Mobiliários no mercado de investimentos qualificado, eis que há inevitáveis barreiras de acesso e grande assimetria de informação que desencoraja muitos de aventurarem-se nesse meio, assim como a insegurança natural que deve ser superada antes que a Sociedade esteja preparada para atrair investidores com real potencial de investimento em seu negócio.
Contudo, a construção de uma governança robusta e a preparação da uma estrutura societária apta ao recebimento de aportes perpassa o planejamento de médio e longo prazo, além do reconhecimento dos mecanismos que viabilizam o ingresso de capital e atraem o investidor especulativo, cada vez mais disposto e apostar em novos modelos de negócio.

1. Atualmente há em tramitação pelo menos dois Projetos de Lei que tratam do tema, porém, nenhum deles aprovado até a presente data. São eles: PL 6.322/2012, de autoria do Deputado Carlos Bezerra e o PL 3.324/2020, de autoria do Senador Flávio Bolsonaro.

Dr. Homero Gonçalves

OAB/MG 99.915

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