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Fraudes digitais bancárias – O famoso golpe da central falsa

O golpe da falsa central tem se tornado cada vez mais comum. Nele, estelionatários entram em contato com o correntista do banco, em posse de dados pessoais do titular, como nome completo, CPF, e data de nascimento, alegando que foi realizada uma compra suspeita em nome do cliente e que a ligação seria para confirmar a compra antes de ser aprovada pela instituição financeira. A compra não é reconhecida pelo consumidor, que acredita estar falando com a central de atendimento de seu banco, uma vez que o suposto atendente possui suas informações de identificação e age mediante protocolos parecidos com os da instituição financeira.

Todavia, após adquirir a confiança do correntista, que passa a temer pela invasão de suas contas, os estelionatários induzem o cliente a realizar movimentações financeiras em favor do grupo criminoso, ou a conceder acesso remoto aos seus aplicativos do banco.

Com isso, são realizadas transferências bancárias e obtidos empréstimos, de forma fraudulenta. Sendo comum, ainda, que a posterior contestação, pelo correntista, dos valores desviados seja negada pelos bancos.

Porém, o consumidor pode ser ressarcido dos danos sofridos sem, necessariamente, ingressar com ações judiciais contra as instituições financeiras.

Ocorre que, nestes casos, observa-se a ocorrência de falha no tratamento de dados confidenciais financeiros do titular, bem como o descumprimento de normativas previstas pelo BACEN para as instituições financeiras, em especial às disposições que preveem a adoção de medidas de monitoramento e segurança.

Com efeito, as instituições financeiras têm a responsabilidade de adotar políticas eficazes de “Conheça seu Cliente” (KYC, na sigla em inglês) e de monitoramento constante das atividades em contas para prevenir fraudes e garantir a segurança das transações financeiras.

Além do fluxo normal de operações, o monitoramento tem por finalidade identificar atividades suspeitas”, conforme relacionado na Carta Circular 2.826/1998 do Banco Central do Brasil.  Assim, torna-se possível constatar operações incompatíveis com o perfil do usuário.

Trata-se, por conseguinte, de um dever das instituições financeiras de implementar sistemas de monitoramento avançados para detectar e alertar sobre atividades incomuns nas contas dos usuários. Nestes casos, é imprescindível que, em observância aos deveres objetivos de cuidado, os bancos bloqueiem ou recusem a efetivação de transações suspeitas, em uma postura de cautela.

Dessa forma, na ausência de tais deveres de cuidado para a restrição de transações bancárias que não condizem com o perfil do cliente, configura-se a responsabilidade objetiva da instituição financeira pelos danos ocasionados ao cliente.

Inclusive, o STJ, no julgamento do REsp nº 2.052.228 DF, de Relatoria da Ministra Nancy Andrigui, de 12/09/2023, manifestou-se sobre o tema, esclarecendo que: “a ausência de procedimentos de verificação e aprovação para transações atípicas e que aparentam ilegalidade corresponde a defeito na prestação de serviço, capaz de gerar a responsabilidade objetiva por parte da instituição financeira. 

Corroborando o exposto, a Súmula 479//STJ dispõe que “As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias.”

Nesse sentido, na esfera extrajudicial, anteriormente ao ajuizamento de uma Ação de Indenização a ser movida em face do banco, são cabíveis medidas como: Reclamação Formal junto à Ouvidoria do banco envolvido; Notificação Extrajudicial para a instituição financeira; e Reclamação Formal e acompanhamento junto ao Banco Central do Brasil (BACEN), com base nas normativas regulatórias aplicáveis.

Tais medidas extrajudiciais, quando devidamente conduzidas por profissional capacitado, podem ser capazes de ressarcir, rapidamente, o consumidor, sem os ônus e custos envolvidos com o ajuizamento de um processo.

Contudo, não sendo resolvida a questão, o consumidor possui legitimidade e interesse para ingressar com ação de indenização por danos materiais e morais, na qual poderá buscar a repetição em dobro do indébito, bem como a compensação por danos morais.

Destaca-se que, por força do art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, a quantia indevidamente cobrada pelo banco deve ser ressarcida em dobro, uma vez ausente o engano justificável da instituição financeira. Em se tratando de relação de consumo, é possível, ainda, que a negligência do banco em coibir a fraude ou em diligenciar para verificar a ilegitimidade das transações caracterize falta grave e ofensa ao princípio da confiança e da boa-fé objetiva, passível de indenização por dano extrapatrimonial.

Em conclusão, as fraudes digitais bancárias, como o golpe da central falsa, evidenciam falhas no tratamento de dados e na segurança das instituições financeiras. Os bancos têm a responsabilidade de adotar medidas eficazes de monitoramento e segurança para proteger os consumidores. Em caso de fraude, é possível que os consumidores busquem ressarcimento por meio de medidas extrajudiciais, como reclamações formais e notificações, antes de considerar uma ação judicial. Sendo certo, entretanto, que o consumidor tem o direito de buscar indenização pela via processual.

  Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.

        Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.

 

Dr.ª Mariana de Oliveira Alves

 OAB/MG 201.586

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