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Arbitragem: os cuidados na elaboração de cláusulas compromissórias

A adoção da arbitragem como método de resolução de controvérsias, no campo do direito civil e empresarial, pode apresentar inúmeras vantagens para as partes em conflito, na medida em que possibilita a obtenção de uma decisão mais célere, amparada por um procedimento confidencial e essencialmente técnico. Entretanto, para que sejam alcançados os objetivos deste instituto, cada vez mais utilizado pelas empresas, é necessário compreender os cuidados que devem ser tomados no momento da convenção de arbitragem.

Conforme a Doutrina, a convenção de arbitragem poderá ser realizada por meio de um compromisso arbitral ou de uma cláusula compromissória. Através do compromisso arbitral, o método de resolução de conflitos é acordado após a instauração da controvérsia; nesse caso, firma-se um termo de compromisso, através do qual as partes acordam em utilizar a via arbitral para solucionar algum problema.

A cláusula compromissória, por sua vez, permite a eleição da arbitragem de plano, antes do surgimento de qualquer controvérsia entre as partes. Trata-se de medida que garante a eleição de método de solução de conflitos previamente, quando as partes ainda se preparam para a formalização de um negócio jurídico.

Importante ressaltar que a convenção de arbitragem, tanto na modalidade de compromisso arbitral quanto na modalidade de cláusula compromissória, goza de força vinculante e de caráter obrigatório. Por conseguinte, uma vez definido ao juízo arbitral eleito a competência para dirimir os litígios relativos aos direitos patrimoniais disponíveis, derroga-se a jurisdição estatal, conforme entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1818982/MS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/02/2020, DJe 06/02/2020).

Em decorrência de seu caráter vinculante e obrigatório, mostra-se de suma importância a adoção de cuidados no momento de redação da convenção de arbitragem, de forma a garantir maior previsibilidade das condições que deverão ser seguidas pelas partes para a instauração da arbitragem. Nesse sentido, a formalização do acordado por meio de uma redação segura e técnica insere-se na proposta de garantir celeridade e eficiência das decisões do árbitro eleito ou de um Tribunal Arbitral.

Sob tal aspecto, cumpre observar que as cláusulas compromissórias podem ser cheias ou vazias, a depender do conteúdo fixado. Atenta-se que as cláusulas vazias preveem tão somente que eventuais controvérsias deverão ser solucionadas através da arbitragem, sem, contudo, indicar de que forma o procedimento será instaurado, aplicando-se as regras gerais previstas pelos arts. 6º e 7º da Lei de Arbitragem, Lei n.º 9.307/96.

Por conseguinte, caso o procedimento legal não seja suficiente ou não se mostre compatível com o interesse das partes, o ideal é a disposição em contrato de uma cláusula compromissória cheia, que possui os elementos necessários para prever de que forma será instaurada a arbitragem, determinando a instituição arbitral, regras aplicáveis, número de árbitros, forma de escolha dos membros do tribunal ou indicação de único árbitro, idioma e local de arbitragem (CARMONA, 2009).

Nesse caso, os procedimentos e regras dispostos em contrato devem ser dotados de clareza e transparência, sendo certo que, no caso de ambiguidades ou divergências, as discussões acerca da validade da cláusula podem ir de encontro à celeridade e efetividade pretendidas.

Em contratos de longa duração, por exemplo, tais como os contratos nas áreas de energia, gás e petróleo, é comum a previsão das denominadas cláusulas escalonadas, também conhecidas por cláusulas combinadas, as quais podem prever a tentativa de resolução do conflito por método autocompositivo, como a mediação e a conciliação, e, caso o consenso não seja obtido, o posterior direcionamento da controvérsia para decisão por meio da arbitragem (LEMES, 2013).

Referida previsão mostra-se vantajosa para relações duradouras, em que o inadimplemento contratual repercute em cadeia nas demais contratações e subcontratações. No entanto, é imprescindível que a redação da cláusula escalonada estipule com segurança como os processos devem ser iniciados, finalizados e quais deverão ser os respectivos prazos, com o intuito de possibilitar a verificação do cumprimento ou não da cláusula e, em última análise, do cumprimento dos requisitos pré-arbitrais.

Não por outra razão, recomenda-se sempre o auxílio de assessoria jurídica especializada para a estipulação de cláusulas compromissórias e elaboração de termos de compromisso, visando propiciar que a eleição da arbitragem se apresente de fato como método eficiente para a solução da controvérsia, restando afastadas quaisquer divergências e embaraços para a obtenção da resolução do caso.

Bibliografia:
BRASIL. Lei n° 9.307/1996. Dispõe sobre a arbitragem. [online] Disponível em
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9307. Último acesso em 19/09/2020.

BRASIL. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Recurso Especial nº 1818982/MS, Rel. Ministra
NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/02/2020, DJe 06/02/2020.

CARMONA, Carlos Alberto. A arbitragem no processo civil brasileiro. São Paulo: Malheiros, 1993.

LEMES, Selma Ferreira. “Cláusula escalonada ou combinada: mediação, conciliação e arbitragem”, in
Arbitragem Internacional, UNIDROIT, CISG, e Direito Brasileiro, 2013.

Dra. Letícia Agostinho Mouro
OAB/MG nº 200.984

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