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A duplicata escritural e os avanços produzidos pela lei 13.775/2018

Em sua essência a Lei 13.775/2018 promove uma verdadeira revolução no que concerne aos títulos de crédito eletrônicos, modalidade essa prevista no §3°, do art. 889, do Código Civil, mas há muito já experimentada pelas Instituições Financeiras reguladas, cujo o aparato tecnológico e as regras de governança que lhe permitiram superar o paradigma da cartularidade antes mesmo da disposição prevista na Lei Geral.

Diz-se isso, pois desde o final da década de 80, quando do surgimento das Letras Financeiras do Tesouro-LFTs (Decreto-lei nº 2.376, de 25 de novembro de 1987), passando pelas Letras Hipotecárias (Decreto-lei nº 2.287, de 23 de julho de 1986), os Certificados de Recebíveis Imobiliários-CRIs (Lei nº 9.514, de 20 de novembro de 1997), a Cédula de Crédito Bancário-CCB (Lei nº 10.931, de 2 de agosto de 2004), até a Letra de Arrendamento Mercantil (Lei nº 12.249, de 11 de junho de 2010), todas as legislações disciplinaram a forma escritural como meio de registro e transmissão de titularidade.

Contudo, mesmo em se tratando de uma modalidade não tanto inovadora no que concerne ao caráter escritural de sua emissão, registro, transmissão, oneração e quitação, o que a legislação traz como verdadeira revolução é o fato dessa espécie de título de crédito ser um instrumento genuinamente cartular, tendo sua origem na mercancia privada não oriunda de uma operação bancária ou titularizada como dívida pública.

Nesse sentido, a Lei 13.775/2018 transpõe para o sistema eletrônico todas os requisitos de autenticidade e formalismo necessários à segurança e confiabilidade inerentes aos títulos de crédito, mas, ainda que de forma regulada, transfere às entidades privadas homologadas pelo Banco Central a responsabilidade pela gestão das informações de crédito relacionadas à tais operações.

A referida legislação assegura ainda, que por meio da interoperabilidade dos sistemas das escrituradoras, registradoras ou depositárias, as informações sobre os atos praticados pelo sacador, sacado e beneficiário sejam instantaneamente registrados de forma que inexista riscos de fraudes, duplicidades de descontos ou mais de uma operação envolvendo a mesma duplicata.

Tudo isso alcança ainda pode alcançar ainda mais credibilidade com iniciativas como a do sistema blockchain, atualmente utilizado pela principal entidade de registro de duplicatas eletrônicas, a Central de Registros CRDC, cujo volume de operações, desde o início de sua operação em outubro de 2019, registrou, até o momento, 78.157 unidades de duplicatas, somando mais de R$ 580.000.000,00 em valores totais.

Segundo prevê a Confederação Nacional das Instituições Financeiras, o sistema eletrônico de escrituração de duplicatas escriturais tem potencial para saltar de um montante de 400 bilhões anuais para 1,4 trilhão, algo extremamente importante para a melhoria da performance das operações de crédito concedidas com lastro em tais títulos.

Atualmente a regulamentação das operações de emissão, registro, transferência, oneração e quitação desse tipo de documentos é regido pela Circular BACEN 4.016, de 4 de maio de 2020, cujo teor dispõe de forma detalhada sobre os diversos papéis de cada um dos agentes envolvidos na operação, assegurando que as diretrizes contidas em seu art 7° preservem o bom funcionamento do sistema.

Compõe ainda o arcabouço regulatória a Resolução BACEN 4.815, de 4 de maio de 2020, cujo objeto trata da “realização de operações de desconto de recebíveis mercantis e de operações de crédito garantidas por esses recebíveis pelas instituições financeiras” e toda a expectativa do real impacto da tão aguardada mudança ainda depende da homologação da Convenção prevista na Circular BACEN 4.016, documento esse que disciplina a troca de informações entre as entidades e que, após editado, deflagrará uma contagem regressiva para que todas as operações que envolvam desconto bancário de duplicatas sejam exclusivamente realizadas com a espécie escritural.

Ainda que os prazos sejam longos em relação ao desejável, prevendo-se 360 dias para companhias de grande porte (receita bruta anual superior a 300.000.000,00), 540 dias para empresas de médio porte (receita bruta anual acima de R$ 4.800.000,00 e igual ou inferior a 300.000.000,00) e 720 dias para empresas de pequeno porte (receita bruta até R$ 4.800.00,00), a perspectiva é de que as transposição do modelo atual poderá ocorrer espontaneamente mais rápido, dado que as facilidades e vantagens financeiras para operar o modelo atual atrairão os que buscam maior segurança e que desejam evitar o chamado over collateral.

Enfim, aguarda-se que a mais breve implementação do sistema possa trazer maior segurança e melhoria no mercado de crédito, representando um grande salto em direção à definitiva virtualização títulos de dívida, cuja função econômica tem expressiva relevância e torna esse mercado mais eficiente e acessível.

Dr. Homero Gonçalves

OAB/MG 99.915

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