As limitações da Inalienabilidade, Impenhorabilidade e Incomunicabilidade como instrumentos de planejamento sucessório
Muito se fala sobre os institutos da Inalienabilidade, Impenhorabilidade e Incomunicabilidade como instrumentos de planejamento sucessório e patrimonial, quando a intenção é adiantar o legado aos herdeiros, porém, protegendo-o de possíveis invasões por parte de credores, cônjuge ou do próprio receptor da transmissão Nesse sentido, tias cláusulas veem ganhando status de verdadeiras barreiras protetoras contra atos que atentem contra a integridade do patrimônio legado, quando, de fato, representam uma proteção razoável, mas relativa. Por isso, antes de adotar qualquer planejamento que pretenda uma suposta blindagem patrimonial (termo inadequado, mas que aqui se refere pela popularidade que adquiriu), há de se entender as características que podem torna-lo menos efetivo do que o esperado.
Conforme de conhecimento, os institutos de “inalienabilidade, incomunicabilidade e impenhorabilidade” são todos frutos da disposição de vontade de quem grava os bens ao tempo da transmissão gratuita (ato de liberalidade), não sendo passíveis de aplicação ao acervo legatário da legítima, senão quando presente a denominada justa causa. Além disso, há algumas questões legais que podem não satisfazer a pretensão do doador/testamenteiro, quando a sua utilização pressupõe uma suposta “proteção absoluta”.
Abaixo são apontados os principais pontos que podem ajudar a compreender e definir a exata aplicação dos institutos:
Abrangência: Pelo que prevê o art. 1.911 do Código Civil, o estabelecimento de Cláusula de Inalienabilidade pressupõe impenhorabilidade e incomunicabilidade, porém, por decisão recente da Quarta Turma do STJ (já amplamente aceita pela doutrina), o inverso não ocorre. Ou seja, a existência de qualquer das cláusulas de Impenhorabilidade o Incomunicabilidade não pressupõe o efeito de inalienabilidade. Dessa forma, o uso das limitações deve ser baseado nessa interpretação, a fim de gerar os efeitos desejados.
Legítima: Como atos incidentes sobre a disposição gratuita, em muitos casos utilizada como adiantamento de herança, há de se considerar que a doação dos bens com cláusula de Inalienabilidade, Incomunicabilidade e Impenhorabilidade somente pode ser realizada de forma injustificada, quando tratar-se da fração dos bens não compreendidos pela legítima (parcela dos bens destinadas aos herdeiros necessários – 50%). Pelo que dispõe o art. 1.848 do Código Civil, quando a doação recair sobre os bens da legítima, tal ato somente será considerado lícito quando dotado de uma justificativa razoável, que motive a restrição da limitação. Contudo, por ser uma verificação a posteriori, não se trata de um dispositivo que visa impedir a realização da liberalidade, mas que pode trazer uma revisão de legalidade no futuro, se questionado por qualquer interessado (ex. vi. credor/meeiro/proprietário).
Exceções: Mesmo havendo grande proteção imposta pelas cláusulas de Inalienabilidade, Impenhorabilidade e Incomunicabilidade, algumas exceções podem frustrar as expectativas de que as inclui dentro de um planejamento sucessório. São elas:
a) Execução Fiscal: Conforme prevê o art. 30 da Lei de Execuções Fiscais, os bens gravados com Impenhorabilidade e Inalienabilidade estão sujeitos à penhora, não sendo contemplados nessa exceção apenas os bens absolutamente impenhoráveis (como o bem de família);
b) Execução Trabalhista: Valendo-se da interpretação analógico do texto da LEF, muitas decisões trabalhistas já relativizam a impenhorabilidade, por entender que são um obstáculo à reparação do trabalhador, sendo violadoras das regras de dignidade, por proteger o patrimônio de uma pessoa, em detrimento do prejuízo patrimonial de outra (considerada hipossuficiente). (Alguns julgados: AIRR-88800-06.1996.5.02.0023, AIRR – 671-54.2015.5.06.0018, AIRR – 153100-09.2006.5.06.0022.
c) Frutos: Independentemente da limitação aplicada ao bem, seja contra alienação pelo proprietário, comunicação do patrimônio conjugal ou penhora por débitos, há o entendimento majoritário de que os frutos percebidos pelo proprietário não sofrem a restrição imposta ao bem. Nesse sentido, caso seja um bem imóvel, pode-se exemplificar o aluguel ou a renda do bem como um exemplo claro de possível penhora, enquanto, ao se falar em quotas de sociedade, os lucros ou bens que integram o patrimônio empresarial possam ser alvo de constrições.
Portanto, ainda que haja grandes vantagens na proteção do patrimônio transmitido aos sucessores, a limitação deve ser bem estudada e ponderada, posto que a imposição também traz inconvenientes para os próprios receptores, eis que a limitação pode operar em desfavor de uma disponibilidade plena do bem, como ocorre com a Inalienabilidade, impedir a plena disposição voluntária em casos extremos, como a restrição de oferta do bem em penhora (obrigando o sucessor e dispor de bem pessoal mais valioso, se alvo de execução) e não reverter-se em grande resultado, se o regime de casamento do sucessor for o da comunhão parcial de bens.
Por esse e outros motivos, recomenda-se que o Planejamento Sucessório perpasse maiores estudos, um entendimento profundo do caso e a definição de um arranjo estruturado na vontade do sucedido e características particulares dos sucessores.
Dr. Homero Gonçalves
OAB/MG 99.915