Atestado médico é válido para home office?
O atestado médico, ou certificado médico, consiste em um instrumento jurídico já exaustivamente estudado pela doutrina justrabalhista, cujo objetivo é afirmar a veracidade de um fato ou a existência de determinado estado, ocorrência ou obrigação. O atestado médico, portanto, é uma declaração escrita de um diagnóstico médico e suas possíveis consequências práticas. Em regra, é amplamente utilizado para afastamento de trabalhadores com algum grau de enfermidade de suas obrigações laborais.
Por outro lado, o cenário excepcional desencadeado pela pandemia da Covid-19 transformou as relações laborais e acarretou a migração do trabalho presencial, exercido dentro da empresa, para outra modalidade, marcada pela utilização de meios telemáticos: o home office ou teletrabalho.
A nova organização do mundo do trabalho, que torna imprescindível o emprego de meios telemáticos para sua concretização, engendrou novos questionamentos acerca dos limites do poder do empregador sobre o empregado que se submete ao home office. Uma das questões que emergiram dessa nova realidade foi a incerteza sobre o afastamento do trabalhador em home office que, acometido pela Covid-19 e possuindo atestado médico que comprove tal condição, ainda poderia estar em condições de exercer suas funções sem o deslocamento até a sede física da empresa, uma vez que a questão pandêmica recai justamente sobre o isolamento domiciliar.
Por ser tema da ordem do dia, a doutrina e a jurisprudência ainda não se debruçaram especificamente sobre o assunto, sendo esse, portanto, um vácuo normativo a ser preenchido pela interpretação.
Quando se analisa o que dispõe a CLT em seu art. 6°, vê-se que resta vedada qualquer distinção entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador e aquele executado à distância no domicílio do empregado. Dessa forma, é de se interpretar que, por questão de isonomia, por serem trabalhos em locais diferentes, que as condições para se trabalhar em um deles difere das condições para se trabalhar em outro. Em síntese, não se pode afirmar que o mesmo atestado que comprova a impossibilidade de o empregado se deslocar até a sede física da empresa possa sempre conduzir ao afastamento do empregado que atue do seu domicílio, em home office. É imposição da isonomia que diferentes sejam tratados de maneira diferente.
Assim sendo, deve a empresa permanecer adstrita ao conteúdo do atestado, respeitando as orientações médicas, mas afastando o empregado apenas na medida em que esse se encontre impossibilitado de exercer atividades, ainda que em home office.
Diante disso, ressalta-se a importância de que o atestado médico receba atenção especial do profissional médico, para que seja bem construído e de fácil entendimento para o empregado e para o empregador. Nesse sentido, o documento deve conter, sobretudo, recomendações médicas expressas para afastamento da pessoa enferma de sua ocupação, as quais devem levar em conta a modalidade de trabalho desempenhada e as condições particulares para sua realização naquela modalidade específica. Essa é a melhor forma de garantir segurança jurídica a ambas as partes da relação jurídica e evitar dúvidas acerca da extensão dos efeitos do atestado.
Em suma, o afastamento mostra-se plenamente possível para o trabalho realizado em homeoffice, em razão da necessária aplicação de uma interpretação isonômica, e sua concessão deve ser amparada por atestado médico que, além de abordar o necessário distanciamento social, deverá apresentar, de forma técnica, a ausência de condições para o exercício laboral na modalidade remota.