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Análise sobre a utilização de meios consensuais de resolução de conflitos entre as operadoras e os beneficiários

Próximo a completar 11 anos de funcionamento, o núcleo criado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) dedicado a resolução de conflitos entre operadoras de saúde e beneficiários por meio da negociação, mediação e conciliação vem apresentando excelentes resultados no que tange a eficácia desses instrumentos.

Chamada de NIP, a Notificação de Intermediação Preliminar visa solucionar de forma ágil as demandas pelos canais de atendimento da ANS, essas podem ser apresentadas por telefone, presencialmente ou por meio de formulário eletrônico. Após a entrada da solicitação no sistema, a operadora é notificada e possui 05 (cinco) dias úteis para responder ao usuário nos casos de demandas de natureza assistencial como negativa de autorização para realização de cirurgia, agendamento de consultas ou exames e até 10 (dez) dias úteis em casos de demandas de natureza não assistencial, por exemplo, contratos e regulamentos, mensalidades.

Torna-se pertinente salientar os excelentes resultados alcançados com a instituição dos meios adequados para sanar os conflitos, em apuração mais recente realizada em 2020, houve a conquista do maior percentual de queixas, além do resultado mais expressivo: a cada 100 demandas recebidas, 91 foram resolvidas entre beneficiários e operadoras.

Nesse contexto, destacando-se o cenário da pandemia do COVID 19, a ANS vem desempenhado um trabalho eficaz no monitoramento e resolutividade de demandas por informações ou registros de reclamação, tendo alcançado, ainda, o índice de 90,8% na resolução das queixas gerais e sobre queixas relativas a exames de diagnóstico, o índice chegou a 93,2%. Por fim, 92,8% em relação aos exames para identificação de anticorpos (testes sorológicos).

Com base nesses resultados expressivos, é possível inferir que meios como a conciliação, mediação e negociação estão sendo remédios essenciais para “desafogar” o judiciário, assim como a esfera administrativa no que diz respeito a aplicação do direito à saúde envolvendo as normas da ANS.

Nesse ínterim, faz-se necessário mencionar a recente Resolução (número 100) publicada pelo Conselho Nacional de Justiça em junho de 2021, no qual foi feita a recomendação, especialmente aos magistrados, do uso de instrumentos consensuais para solucionar demandas que versem sobre o direito à saúde, inclusive aquelas decorrentes da crise da pandemia da Covid-19, na fase pré-processual ou em demandas já ajuizadas.  Ademais, como forma de concretizar o que foi postulado, houve  referência a criação de Centros Judiciários de Resolução de Conflitos de Saúde (Cejusc), a serem implementados em tribunais.

Em síntese, resta esperar (e torcer) para que, caso venha a ser implementada a Resolução, sua eficácia seja tão significativa ou até superior a alcançada pelos canais de atendimento da ANS.

Thalissa Mendes

 

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É legítima a atuação fiscalizatória do CREA/MG em instituições de saúde?

A Resolução 1.025/2009, do Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (CONFEA), prevê, em seu artigo 3°, bem como parágrafo único, que todo contrato escrito ou verbal para execução de obras ou prestação de serviços relativos às profissões abrangidas pelo Sistema CONFEA/CREA fica sujeito ao registro da Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) no Crea em cuja circunscrição for exercida a respectiva atividade.

Tal obrigação também se aplica ao profissional para o desempenho de cargo ou função técnica que envolva atividades para as quais sejam necessários habilitação legal e conhecimentos técnicos nas profissões abrangidas pelo Sistema CONFEA/CREA, conforme o parágrafo único do artigo supramencionado.

Sem pretensão de preterir as obrigações previstas pelo Conselho Profissional, diante da inquestionável importância da manutenção registro e anotação de responsabilidade técnica para a prevenção de acidentes e danos, o presente texto busca avaliar a legitimidade da atuação fiscalizatória do CREA/MG em instituições de saúde, iniciada a partir da decisão administrativa PL 0045/2020, a qual determinou que 100% dos hospitais do Estado de Minas serão fiscalizados em serviços de engenharia, agronomia e geociência até 31/12/2021, como uma medida de proteção à vida.

Isto posto, a questão jurídica aqui enfrentada se volta à competência do Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia para fiscalizar e exigir documentações de estabelecimentos de saúde, cuja atividade básica não se volta aos serviços realizados pelas profissões por ele reguladas, mas sim a serviços de promoção à saúde.

Conforme a Lei n.º 6.839/1980, que dispõe sobre o registro de empresas nas entidades fiscalizados do exercício de profissões, o registro e a anotação dos profissionais legalmente habilitados serão obrigatórias nas entidades competentes para fiscalização em razão da atividade básica exercida ou em relação àquela pela qual prestem serviços a terceiros. Em outras palavras, obriga-se ao registro e anotação as empresas cuja atividade básica ou prestação de serviços envolvam as especialidades de Engenharia, Arquitetura e Agronomia.

Registre-se que referido entendimento é adotado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), que se posiciona no sentido de que a especialidade da atividade básica desenvolvida pela empresa define sob a égide de qual órgão está a fiscalização de seu desempenho (REsp 475.077/SC).

Por conseguinte, a atuação fiscalizatória do CREA e a solicitação de documentos a instituições de saúde, medidas adotadas após a decisão administrativa PL n.º 0045/2020, são questionáveis do ponto de vista jurídico, não havendo amparo para a aplicação de quaisquer sanções e penalidades em caso de descumprimento da solicitação.

Por derradeiro, cumpre ressaltar ser inafastável a responsabilidade civil do estabelecimento de saúde, no papel de prestador de serviços, em caso de intercorrências ou danos advindos de contratos firmados sem registro e anotação de responsabilidade técnica, o que, porém, não o coloca sob a fiscalização de Conselho Profissional alheio a sua atividade básica, devendo eventuais responsabilidades serem apuradas em sede judicial.

Com efeito, a observância de normas técnicas para execução de obras nas dependências da instituição de saúde é de máxima importância, mas a tarefa deverá ser exigida dos profissionais e empresas cuja atividade básica exercida se enquadre entre as especialidades reguladas pelo CREA/MG.

Dra. Letícia Agostinho Mouro
OAB/MG nº 200.984

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Limite de contribuição de terceiros: uma discussão a ser enfrentada pelo STJ

Em sede de recurso repetitivo, o Supremo Tribunal Federal irá decidir, em breve, se o limite de 20 salários mínimos deverá ser aplicável à base de cálculo das contribuições parafiscais arrecadadas por conta de terceiros.
Diante da abundância de recursos impetrados relacionados ao tema, foram afetados pelos Ministros os Recursos Especiais 1.898.532 e 1.905.870. Neste caso, a relevância da matéria e sua repercussão geral afetará diretamente o controle financeiro das empresas contribuintes. A referida tese é discutida no STJ desde 2008, contudo, por se tratar de decisões monocráticas não geravam precedentes.
Afinal, o que são essas contribuições?
Tratam-se de contribuições parafiscais obrigatórias destinadas a outras entidades e fundos, normalmente chamadas de contribuições de terceiros, como por exemplo: Sesi, Senai, Sesc, Senac, Sebrae, Incra, Sest, Senat e FNDE (salário-educação). Tais contribuições são devidas mensalmente e sem limitação.
O artigo 4º da Lei 6.950/81, instituiu a base de cálculo das contribuições parafiscais arrecadadas ao teto de 20 salários mínimos. Contudo, posteriormente, o artigo 3º do Decreto-Lei nº 2.318/86 removeu o limite de 20 salários-mínimos exclusivamente para as contribuições previdenciárias. Justificados neste Decreto, as autoridades competentes desde então exigem que as contribuições destinadas a terceiros seja sobre a totalidade da sua folha de salários.
Mas porque esta decisão é tão importante para sua empresa?
Caso o STJ decida positivamente pela vigência do artigo 4º da Lei 6.950/81 e sua consequente limitação as contribuições de terceiros, a carga tributária sobre a folha de pagamento das empresas contribuintes será reduzida consideravelmente, gerando maior segurança jurídica para os contribuintes restituírem/compensarem os valores recolhidos a maior nos últimos cinco anos, sem a aplicação da limitação.
Com a suspensão de todos os processos pendentes sobre o assunto em nível nacional, sendo estes coletivos ou não, espera-se que em breve tal questão seja enfrentada e definitivamente sanada, portanto, vale a pena ficar de olho neste assunto.

Dra. Marina Azevedo

OAB/MG – nº 181107

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Você sabe a relação do compliance com a governança corporativa?

Primeiramente, é de suma importância entender tais conceitos. O compliance é, essencialmente, uma base da governança corporativa – ou seja, é um elemento intrínseco às práticas da sociedade empresária. Isso porque a ideia de compliance está ligada a uma estrutura de segurança pelo cumprimento de regras interna e externamente à atividade empresarial.

Correlato a essa ideia, está o conceito de governança corporativa, o qual, segundo Arnoldo Wald, é, per se, a “criação do direito dentro da sociedade”. Por sua vez, a governança corporativa é pautada por quatro linhas mestras, também definidas pelo professor Wald, quais sejam: transparência, a integridade, a prestação de contas e a responsabilidade corporativa.

No pilar da equidade, também chamado por alguns de integridade, considera-se o respeito aos acionistas – sejam estes majoritários ou minoritários – e, com efeito, o efetivo cumprimento da lei. Nesse ponto, enfatiza-se a figura do compliance – figura que ganhou força no Brasil em decorrência dos escândalos revelados pela “Operação Lava Jato”, sobretudo a partir do ano de 2013.

A aplicação do compliance, portanto, considera o cenário corporativo atual e a necessidade de atenção às sanções ligadas à corrupção e perda de reputação das sociedades empresárias, considerando a tentativa de moldar o comportamento dos agentes em seu comprometimento de cumprir com as regulações a que estão submetidos.

Assim, na perspectiva da função social da empresa e com objetivo de combater condutas ilícitas e fraudes corporativas, pode-se considerar como bases do compliance: (I) o dever de monitorar as obrigações e prazos da sociedade; (II) transparência e acesso às informações não sigilosas; (III) o correto arquivamento e registro de dados; (IV) uma adequada forma de escrituração contábil; (V) existência de canais de denúncia independentes e efetivos para os integrantes da sociedade; (VI) elaboração de manuais e guias éticos claros; (VII) efetivação e treinamento permanente do quadro de pessoal da sociedade, considerando a necessária estrutura institucionalizada que se faça permanente independente das eventuais transições ocorridas no quadro de gestão da companhia.

Em destaque do elemento da transparência, é indiscutível que a fim de potencializar o controle interno e a perfeita dinâmica do programa de compliance, torna-se essencial que a companhia esteja atenta às formas de evitar responsabilidade corporativa, devendo, portanto, promover a divulgação clara e precisa de seu desempenho econômico e financeiro. Tal atitude abarca a participação dos sócios e stakeholders – fortalecendo, além da transparência de fato, a noção de cumprimento das normas de anticorrupção e demais instruções de órgãos reguladores, como o CADE na esfera da concorrência.

Por fim, ressalta-se concomitantemente as bases de treinamento e comunicação. Considera-se para tanto que o programa de compliance deve fazer parte da cultura de toda a empresa, e, para isso, além da adesão da alta administração, os colaboradores necessitam ter visão das regras, assim como dos seus objetivos. Nessa seara, os Artigos 41 e 42 do Decreto 8.429/15 (que regulamenta a Lei 12.846/2013 – “Lei Anticorrupção”) fornecem algumas referências para a estruturação dos programas, e sublinham os padrões de ética, a ênfase em treinamentos, as revisões periódicas o monitoramento contínuo visando o aperfeiçoamento das disposições em integridade. Estas e outras disposições servem de subsídio, por exemplo, ao Guia de compliance do CADE, que se utiliza destas diretrizes para traçar recomendações para prevenção das condutas anticompetitivas – ressaltando, em diversas ocasiões, a fundamentalidade dos treinamentos para conhecimento dos colaboradores, além de alinhamento no controle interno da sociedade empresária.

Dra. Luíza Athouguia Abdalla
OAB/MG – nº 200.947

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STJ reforça que os simples prints de conversas de WhatsApp não são válidos

A 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) voltou a aplicar entendimento já firmado pelo colegiado em RHC 79.848 para declarar que não podem ser usadas como provas válidas as mensagens obtidas por meio do print screen da tela do WhatsApp.

Dentre os principais motivos que levaram os ministros a votar pela invalidade dos espelhamentos de conversa está a possibilidade do usuário deletar o envio de novas mensagens e também de excluir mensagens antigas ou recentes, tenham elas sido enviadas pelo usuário ou recebidas de algum contato, sendo que essa eventual exclusão, sobretudo no WhatsApp Web, não deixa vestígios.

Afinal, como tornar válidos os registros obtidos de conversas de WhatsApp?
Resposta objetiva: Ata Notarial (art. 384 do CPC arts. 6º e 7º da Lei nº 8.935/94, a Lei dos Cartórios), que nada mais é que instrumento no qual o tabelião de cartório de notas ou seu preposto, a pedido de pessoa capaz ou representante legal, materializa fielmente em forma narrativa os fatos, o estado das coisas e de pessoas, de tudo aquilo que verifica com seus próprios sentidos sem emissão de opinião, juízo de valor ou conclusão, portando por fé que tudo aquilo presenciado e relatado representa a verdade, e consignando em seu livro de notas ou no próprio documento apresentado.

Resumidamente, você deve levar o seu aparelho de celular ao tabelião do cartório de notas e solicitar a confecção e registro de uma ata notarial. O tabelião (ou seu preposto) confirmará se as cópias das conversas são verdadeiras ao fazer uma averiguação dos fatos apresentados por aquele que pedir a elaboração do documento e fará o registro em seu livro, e as informações que forem registradas passam a ter valor de prova e presumem-se verdadeiras.

Isso quer dizer que os simples prints de conversas nunca serão aceitos como provas válidas?
Não, até mesmo porque não há edição de lei ou publicação de súmula de Tribunal Superior que proíba que o juiz ou juíza da causa reconheçam a validade e deem credibilidade aos espelhamentos de tela. Mas, convenhamos: você vai correr o risco de perder a chance de usar aquela que pode ser a sua principal prova por conta de uma falta de atenção procedimental?

Guilherme de Castro
OAB/RJ 208.219

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Modalidades possíveis para o encerramento da atividade empresarial

Você sabia que existem modalidades diversas para o encerramento da atividade empresarial?

Entende-se como dissolução o conceito trazido por Fábio Ulhoa: “[…] significa o procedimento de terminação da personalidade jurídica da sociedade empresária, isto é, o conjunto de atos necessários à sua eliminação, como sujeito de direito”. As sociedades limitadas estão sujeitas aos seguintes regimes de dissolução.

De forma normal, considera-se a extinção pelo cumprimento do contrato social. De forma anormal, apresenta-se as seguintes hipóteses: nulidades (absolutas ou relativas), a resilição, a resolução ou por morte.

Além de serem admitidos os procedimentos judicial e extrajudicial, a dissolução pode ser total ou parcial, hipótese trazida pelo Código Civil. A legislação, diante dessa hipótese, traz o seguinte rol de possibilidades: exercício de retirada de um dos sócios por sua vontade, que decorre da vontade de não permanecer vinculado; expulsão ou exclusão de sócio, havendo a aferição de alguma forma de culpa, o que pode ser de forma sancionadora (descumprimento de deveres de sócio), ou não sancionadora (liquidação ou incapacidade); por morte de sócio; e, por fim, liquidação a pedido de algum credor.

Ressalta-se que, diante de tal hipótese de resolução parcial, o Código de Processo Civil criou um procedimento específico para a ação judicial de dissolução, plasmado nos artigos 599 a 609. O procedimento pode ser isolado, relativo ou a exclusão de sócio ou liquidação e apuração de haveres, ou pode cumular os pedidos.

As sociedades empresárias podem estar submetidas ou ao regime das Sociedades Anônimas ou ao regime do Código Civil. O que os diferencia, caso a caso, é o vínculo societário estabelecido em seu contrato. Assim sendo, segundo a legislação civil entende ser necessário cumprir os seguintes passos: a definição da causa, a apuração de haveres e a partilha.

Analisando-se inicialmente as causas possíveis para a dissolução, temos: a extinção normal pelo cumprimento do contrato ou a anormal, que se dá por fatores exteriores. Nesse último caso, observa-se as seguintes hipóteses: existência de nulidade relativa ou absoluta; resilição (por vontade), a qual pode ser unilateral (denúncia) ou bilateral (distrato); resolução, que é a inexecução, a qual se for culposa é chamada de rescisão; ou causa mortis. Ressalta-se que a legislação compreende a possibilidade da extinção ser total ou parcial. Verifica-se, portanto, que dentro das causas supramencionadas o direito de retirada de sócio e a exclusão de sócio merecem análise detalhada, pois possuem requisitos específicos.

O primeiro caso, relativo ao direito de retirada, está plasmado no artigo 1029 do Código Civil, o qual prevê os seguintes critérios: sendo sociedade de prazo indeterminado, notificação aos demais com antecedência de 60 dias; se de prazo determinado, comprovação judicial da justa causa. A legislação também rege que nos 30 dias subsequentes pode-se decidir pela dissolução da sociedade. Assim, tal possibilidade é a prerrogativa de um ato unilateral de vontade de não estar mais relacionado àquele vínculo contratual outrora criado. A notificação encaminhada aos demais sócios não possui forma estabelecida em lei, mas deverá também ser apresentada na Junta Comercial, a fim de que se possa ser providenciado a alteração contratual de forma devida.

O segundo caso aqui analisado é a hipótese de exclusão de sócio, a qual está plasmada nos artigos 1030 e 1085 do Código Civil. Diante dessa prerrogativa, a lei exige, inicialmente, que que a exclusão seja prevista no contrato social, bem como deverá ser requerida pela maioria dos sócios, os quais detenham a maioria do capital social. Ademais, deve ser apresentada a conduta comprometedora do sócio excluído, diante de uma causa justa. Por fim, o procedimento envolve um agendamento de reunião ou assembleia, em que se debata esta pauta unicamente e que a convocação do sócio a ser excluído seja em tempo hábil para apresentação de sua defesa. Em ambos os casos, o rito seguirá para a apuração de haveres e seu cumprimento. Ressalta-se, por fim, que o procedimento pode ser feito de forma judicial, observando-se aos artigos 599 e seguintes do CPC.

Dra. Luíza Athouguia Abdalla
OAB/MG – nº 200.947

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Medidas especiais para empresas em Recuperação Judicial diante da Covid-19

Sabe-se que as empresas em Recuperação Judicial ou em Falência já possuem um enquadramento especial, principalmente por sua situação de vulnerabilidade financeira. O regime de tratamento é específico na legislação e na própria abordagem com os seus credores, seguindo um rito específico, haja vista a sua intenção precípua de manutenção da atividade empresária.

Diante disso, considerando-se as possibilidades diversas de situações inesperadas, tanto no mundo dos negócios, quanto em qualquer outro âmbito, sabe-se que as empresas sofreram o seu impacto, mas em especial as empresas que estão sob algum desses regimes mencionados.

Considerando a surpreendente pandemia que assolou e continua a impactar o mundo, a Covid-19, foi necessário a criação de tratamentos diferenciados para as empresas em falência ou recuperação, para que os impactos pudessem ser sofridos de forma a permitir a continuidade dos procedimentos.

Frente a tal cenário, o Conselho Nacional de Justiça elaborou a Recomendação de nº 63, a fim de que estratégias possam ser adotadas, em especial pelo poder judiciário, para os casos de recuperação ou falência de empresas. Dentro das recomendações, destaca-se:

1)a prioridade nas decisões sobre levantamento de valores nos casos de recuperação; suspensão das assembleias de credores de forma presencial, autorizando a forma virtual;
2)permissão de suspensão de prazos para adiamento de assembleias quando necessário;
3)possibilidade de apresentação de plano modificado com prazo adequado; possibilidade de fiscalização de forma virtual ou remota por meio dos administradores; cautela na análise dos pedidos de urgência.

Além das medidas citadas, a recomendação trouxe outras abordagens mais específicas à atualização do magistrado. Vale ressaltar que além da recomendação em questão, o CNJ também criou um Grupo de Trabalho para modernização de digitalização dos processos de recuperação e falência (Portaria 162), além de ter determinado medidas de suspensão de atividades e prazos.

Ressalta-se que as recomendações são prerrogativas dos juízes para facilitar e possibilitar a continuidade dos procedimentos em questão, mantendo a autonomia dos magistrados para decidir individualmente sobre os processos.

Dra. Luíza Athouguia Abdalla
OAB/MG – nº 200.947

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A Importância da Defesa Técnica no Processo Ético-Profissional Médico

Os Conselhos Profissionais de Medicina são, simultaneamente, disciplinadores e julgadores da classe médica, cabendo-lhes prezar pelo desempenho ético e pelo prestígio da profissão e dos que a exercem legalmente. Nesse sentido, a legislação lhes confere o dever de apuração de denúncias pela esfera administrativa, regulamentado pela Resolução n.º 2.145/2016, do Conselho Federal de Medicina, e sujeito às disposições constitucionais.
Ressalta-se que, à semelhança de processos judiciais, os procedimentos administrativos de apuração de infrações éticas ancoram-se nos princípios da ampla defesa e do contraditório, devendo ser garantida plena oportunidade ao profissional médico denunciado para eximir-se da acusação a ele oferecida. Em outras palavras, a apuração dos fatos deve ser pautada na legalidade, sendo certo que a não observância deste princípio pode acarretar o reconhecimento de nulidade do processo pela via administrativa, quando em instâncias superiores, ou pela via judicial.
Não por outra razão, a apuração de eventuais descumprimentos de caráter ético é realizada por meio de dois procedimentos, previstos pela Resolução n.º 2145/2016, que possuem o condão de oportunizar a apresentação de esclarecimentos, provas e argumentos de defesa. São eles: a Sindicância e Processo Ético-Disciplinar (PEP).
A Sindicância consiste em procedimento preliminar à abertura do Processo Ético-Disciplinar (PEP), instaurado a partir do recebimento de denúncia pelo Conselho Regional de Medicina (CRM) ou pela denúncia realizada de ofício (por iniciativa do próprio CRM).
Nessa etapa, embora não seja obrigatória a manifestação do médico denunciado, é recomendável contar com o auxílio técnico para apresentação de esclarecimentos e documentos, tendo em vista que, se forem afastadas as evidências de infração ética, a sindicância poderá ser desde logo arquivada, evitando-se a abertura do Processo Ético-Profissional.
Porém, em que pese a defesa técnica ser recomendável desde a instauração da sindicância, sua aplicação mostra-se primordial na etapa subsequente, quando da abertura do Processo Ético-Profissional (PEP). Com efeito, se forem constatadas evidências de ocorrência de infração ética por parte do médico denunciado durante a sindicância, será elaborado relatório fundamentado pelo Conselheiro Sindicante e instaurado o PEP, mediante decisão colegiada da Câmara respectiva.
Nesse caso, ter-se-á início o processo administrativo, composto de procedimentos semelhantes ao Processo Judicial: apresentação de defesa escrita, realização de audiência de instrução processual, apresentação de alegações finais escritas e julgamento, sendo imperioso mencionar, também, a possibilidade de recurso às instâncias superiores.
Em referidas etapas, notadamente no momento de apresentação da defesa escrita, garante-se a oportunidade ao denunciado de evidenciar sua versão dos fatos, impugnar de forma fundamentada as infrações éticas que lhe estejam sendo atribuídas e apontar eventuais circunstâncias atenuantes ou excludentes de responsabilidade.
No entanto, as alegações realizadas em sede de defesa não podem se mostrar genéricas, sendo de suma importância trazer ao processo elementos comprobatórios dos fatos e argumentos apresentados. Nesse sentido, tratando-se de matéria de ordem ética e médica, é recomendável instruir o processo com provas técnicas, consubstanciadas em laudos, prescrições médicas, registros em prontuário ou fichas de atendimento, Procedimentos Operacionais Padrão (POP), dentre outros documentos relacionados aos argumentos e circunstâncias levadas à conhecimento pela defesa.
Registre-se que a má condução da instrução do processo, quando ausente a defesa técnica, pode ensejar a aplicação das penalidades previstas pelo CRM no artigo 22 da Lei nº 3.268/1957 e variam entre advertência e censura confidenciais, censura pública, suspensão do exercício profissional por até 30 dias e, em casos extremos, a cassação do exercício profissional (esta última pena depende de convalidação do CFM).
Por conseguinte, tendo em vista a complexidade e as inúmeras consequências que decorrem de um processo ético-profissional, torna-se necessária a assistência jurídica permanente e técnica no decorrer do procedimento, sendo certo que deve ser observado o cumprimento dos princípios da legalidade, ampla defesa e do contraditório, bem como a necessidade de instrução com provas técnicas e essenciais à defesa.

Dra. Letícia Agostinho Mouro
OAB/MG nº 200.984

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Desafios na Elaboração do Contrato de Prestação de Serviços

O contrato de prestação de serviços é aquele cujas disposições disciplinam a relação entre os contratantes acerca de qualquer atividade lícita, executada de forma manual ou intelectual, conforme disposto no Código Civil Brasileiro. Vale frisar que essa espécie contratual possui forma livre, ou seja, os contratantes podem disciplinar o acordo conforme suas necessidades e pretensões, desde que pautadas nas normas jurídicas que disciplinam a relação. É importante destacar que o vínculo criado na prestação de serviços não é empregatício, mas de natureza contratual, entre um prestador autônomo e um contratante. Outro destaque que merece atenção é a diferenciação entre contrato de prestação de serviços e contrato de empreitada, sendo o primeiro direcionado à execução e o segundo ao resultado.

Para realizar a contratação de uma prestação de serviços, as partes devem ser plenamente capazes, consentir quanto ao seu conteúdo e possuírem habilitação para execução do serviço, caso a legislação assinar o exigir (como nos casos de profissionais que necessitam de registro profissional para exercer determinada atividade). O objeto dessa espécie de contrato, assim como em qualquer outro, deve ser lícito (não ser contrário ao ordenamento jurídico), possível (não ser impossível de ser executado) e determinável (com especificações quanto ao limite da obrigação). A duração desse contrato pode perdurar por prazo indeterminado ou determinado, sendo este limitado à duração de quatro anos. Por fim, sua extinção pode ocorrer pelo alcance do termo final, morte de uma das partes, inadimplemento, vontade das partes ou motivos de força maior.

Para que a prestação de serviços não se configure como vínculo empregatício, é necessário que os requisitos da relação de emprego não estejam presentes. Desse modo, o contratado não deve prestar o serviço, cumulativamente, de forma pessoal, subordinada, habitual e onerosa. Muito embora a maioria dessas características esteja presente também na relação de prestação de serviços, existem diferenças sutis que poderão afastar ou não o vínculo empregatício. Por essa razão, é necessário que, mesmo antes de iniciar as tratativas, o contratante procure um profissional especializado para entender qual a melhor forma de contrato a ser adotada no caso concreto.

Em relação à diferenciação entre o contrato de prestação de serviços e o contrato de empreitada, as duas principais distinções entre eles são sua finalidade e a forma de remuneração. No que tange à finalidade, a prestação de serviços caracteriza-se como uma obrigação de meio e a empreitada como uma obrigação de fim, ou seja, enquanto aquela se direciona a execução do serviço específico, esta é focada no resultado finalístico, na entrega. Acerca da remuneração, na prestação de serviços o contratante receberá pelos esforços dispendidos na execução do trabalho e na empreitada ganhará pelo sucesso na entrega do resultado.

Além de observar esses cuidados, é de suma importância que os contratantes definam no instrumento de formalização as condições cujo contrato se baseará, como as obrigações de cada parte, o preço devido pela execução do serviço, as despesas oriundas da execução, os possíveis reajustes, o modo de rescisão e as multas ou penalidades, além da correta qualificação das partes. Para tanto, é de suma importância que, em contratações de médias e grandes proporções, os contratantes estejam assessorados por profissionais capacitados e experientes para a formalização destes instrumentos contratuais. Assim, antes de realizar a negociação, procure seu advogado para conhecer mais questões sobre o contrato de prestação de serviços.

Valdemir Souto

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CADASTRO DE INADIMPLENTES: limites e restrições ao registro de consumidores em banco de dados

Os bancos de dados de consumidores, conhecidos como “cadastros de consumo”, consistem em arquivos organizados e sistematizados mantidos por pessoas jurídicas, tais como a Serasa Experian, que são contratadas por fornecedores e prestadores de serviços para a disponibilização de informações visando à proteção de crédito.

Trata-se de um serviço lícito, mas sujeito a inúmeros regramentos legais, que tem por finalidade assegurar a garantia dos direitos fundamentais previstos no art. 5º, inc. X, da Constituição Federal de 1988, a qual determina como invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

Por isso, máxima importância deve ser atribuída à consulta ao banco de dados, bem como aos registros de consumidores que deixem de assumir obrigação de pagamento. Registre-se que é objetiva a responsabilidade da instituição pelos danos causados ao consumidor em decorrência de inclusão indevida em cadastro de inadimplentes, gerando o dever de indenizar pelo caráter in re ipsa do dano moral sofrido pelo consumidor, conforme entendimento já pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Assim, para a realização de registro de inadimplentes em banco de dados de proteção ao crédito, devem ser constatados os seguintes requisitos: a) existência de um débito líquido e certo; b) constatação de dívida vencida; c) prévia e expressa comunicação do consumidor sobre o cadastro de seu nome em banco de dados.
Quanto à comunicação prévia do consumidor, o Superior Tribunal de Justiça tem se posicionado no sentido de atribuir esta obrigação ao órgão mantenedor do banco de dados. No entanto, é recomendável que a empresa consulente se resguarde com notificação extrajudicial prévia à inscrição do débito, de forma a demonstrar que o consumidor foi comunicado sobre a existência da dívida, bem como sobre as penalidades em caso de inadimplemento.

Além disso, em atenção à Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei n.º 13.709/2018), o contrato de prestação de serviços ou fornecimento a consumidores deverá prever a possibilidade de inscrição dos débitos em cadastro de inadimplentes e, por conseguinte, da transferência de dados pessoais para instituições mantenedoras de banco de dados.

Em relação à possibilidade de consulta de débitos negativados, salienta-se que as informações apresentadas são confidenciais e se voltam ao auxílio em decisões de negócios próprios, não podendo, em nenhuma circunstância, serem divulgadas a terceiros ou utilizadas para finalidades distintas. Portanto, na avaliação do risco de crédito, deve ser sempre respeitada a tutela da privacidade e a máxima transparência nas relações negociais, conforme as previsões contidas no Código do Consumidor.

Por derradeiro, importante considerar que a informação sobre o débito não pode ser mantida por prazo superior a 05 (cinco) anos, contados da data de registro, independentemente do prazo prescricional, conforme entendimento extraído do verbete sumular n.º 323, do STJ. Além disso, em caso de pagamento do valor em aberto pelo devedor, a inscrição deverá ser cancelada em 05 (cinco) dias úteis, sob pena de incidência de indenização por danos morais em decorrência de inscrição indevida.

Em suma, os procedimentos de inscrição e cancelamento de inscrições devem ser realizados com cautela e controle por prestadores de serviços e fornecedores, sobretudo em razão dos prejuízos que podem ser gerados por registros indevidos de consumidores, para os quais é conferida especial proteção pelo ordenamento jurídico. Em caso de dúvidas, recomenda-se sempre que a empresa busque orientação a partir de uma consultoria jurídica especializada, de forma a prevenir possíveis problemas e eventuais condenações judiciais pelo uso indevido do sistema de consulta e cadastro a bancos de inadimplentes.

Dra. Letícia Agostinho Mouro
OAB/MG nº 200.984

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