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COVID-19 e as Relações de Consumo

Em meio à pandemia da COVID-19, com o cancelamento de viagens e eventos, além de inúmeros decretos municipais para fechamento de comércio não essencial e o exponencial aumento de compras via internet, torna-se cada vez mais relevante a observância aos direitos consumeristas.

Algumas orientações são de conhecimento geral, como ao realizar compras pela internet, verificar se o site ou aplicativo tem procedência e se são confiáveis; atentar-se para o prazo de arrependimento de sete dias, entre outros.

Contudo, no contexto atual, novas precauções devem ser adotadas, além da atenção à aplicabilidade de diversas normas que garantem a boa manutenção das relações de consumo.

Fatos como a pandemia de Coronavírus acarretam as mais diversas situações que podem ser abarcadas pela Teoria da Imprevisão, tipificada no artigo 317 do Código Civil, com complementação pelo artigo 478 do mesmo texto legal, colacionados abaixo, e que tem por finalidade precípua restringir o enriquecimento ilícito de uma das partes da relação jurídico-contratual em detrimento da outra, observe:

Art. 317: Quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação.

Art. 478: Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação.

Mais especificamente, no âmbito das relações de consumo, tem-se ainda o artigo 6º, incisos IV, V, VI do Código de Defesa do Consumidor, que garante ao consumidor sua proteção em face de cláusulas contratuais ou práticas abusivas, bem como garante a possibilidade de modificação de cláusulas que estabeleçam prestações desproporcionais ou até mesmo a revisão contratual em caso de superveniência de fato que implique na consequente onerosidade excessiva para uma das partes:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

[…]

IV – a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços;

V – a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas; […].

Neste panorama, diversas medidas estatais, já previstas em lei, foram tomadas com a finalidade de se evitar o maior enfrentamento à dificuldades financeiras pela população, por exemplo: suspensão de atividades letivas e cursos; prorrogação do vencimento de dívidas e impossibilidade de corte de serviços essenciais, tais como água e luz.

Porém, há algumas práticas específicas a que o consumidor deve se atentar, a fim de que não restem dúvidas sobre a legalidade destas:
a) Limitação da quantidade de produtos por cliente: é uma prática legal, haja vista a possível dificuldade de abastecimento de certos produtos no comércio, como álcool em gel;

b) Aumentos excessivos dos preços das mercadorias: como dito anteriormente, é possível a dificuldade de abastecimento de certos produtos no comércio, porém, apesar da regra “da oferta e da procura”, aumentos excessivos dos preços de quaisquer produtos se trata de prática ilegal;

c) Cancelamento ou reagendamento de eventos: o organizador do evento poderá manter os ingressos já vendidos, em caso de reagendamento, porém, caso o consumidor simplesmente opte pelo reembolso ou, em caso de cancelamento, a devolução do valor investido pelo consumidor deverá ser realizada integralmente;

d) Viagens: o hotel deverá proporcionar ao hóspede a opção entre o crédito ou devolução do valor pago a título de reserva. Já em relação às companhias aéreas, o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) de 20/03/2020 prevê que a viagem poderá ser remarcada pelo passageiro, sem custos adicionais ou ainda o passageiro poderá cancelar a viagem, sendo reembolsado em até 12 (doze) meses.

Assim, por todo o exposto, frisa-se mais uma vez a relevância da atenção ao direito consumerista neste período, tanto para o consumidor, quanto para os fornecedores, que mais do que nunca, devem pautar a relação de consumo pela boa-fé, prezando pela cooperação mutua nestes tempos incertos.

Larissa Oliveira Machado
OAB/MG – n° 157.880

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