É legítima a atuação fiscalizatória do CREA/MG em instituições de saúde?
A Resolução 1.025/2009, do Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (CONFEA), prevê, em seu artigo 3°, bem como parágrafo único, que todo contrato escrito ou verbal para execução de obras ou prestação de serviços relativos às profissões abrangidas pelo Sistema CONFEA/CREA fica sujeito ao registro da Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) no Crea em cuja circunscrição for exercida a respectiva atividade.
Tal obrigação também se aplica ao profissional para o desempenho de cargo ou função técnica que envolva atividades para as quais sejam necessários habilitação legal e conhecimentos técnicos nas profissões abrangidas pelo Sistema CONFEA/CREA, conforme o parágrafo único do artigo supramencionado.
Sem pretensão de preterir as obrigações previstas pelo Conselho Profissional, diante da inquestionável importância da manutenção registro e anotação de responsabilidade técnica para a prevenção de acidentes e danos, o presente texto busca avaliar a legitimidade da atuação fiscalizatória do CREA/MG em instituições de saúde, iniciada a partir da decisão administrativa PL 0045/2020, a qual determinou que 100% dos hospitais do Estado de Minas serão fiscalizados em serviços de engenharia, agronomia e geociência até 31/12/2021, como uma medida de proteção à vida.
Isto posto, a questão jurídica aqui enfrentada se volta à competência do Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia para fiscalizar e exigir documentações de estabelecimentos de saúde, cuja atividade básica não se volta aos serviços realizados pelas profissões por ele reguladas, mas sim a serviços de promoção à saúde.
Conforme a Lei n.º 6.839/1980, que dispõe sobre o registro de empresas nas entidades fiscalizados do exercício de profissões, o registro e a anotação dos profissionais legalmente habilitados serão obrigatórias nas entidades competentes para fiscalização em razão da atividade básica exercida ou em relação àquela pela qual prestem serviços a terceiros. Em outras palavras, obriga-se ao registro e anotação as empresas cuja atividade básica ou prestação de serviços envolvam as especialidades de Engenharia, Arquitetura e Agronomia.
Registre-se que referido entendimento é adotado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), que se posiciona no sentido de que a especialidade da atividade básica desenvolvida pela empresa define sob a égide de qual órgão está a fiscalização de seu desempenho (REsp 475.077/SC).
Por conseguinte, a atuação fiscalizatória do CREA e a solicitação de documentos a instituições de saúde, medidas adotadas após a decisão administrativa PL n.º 0045/2020, são questionáveis do ponto de vista jurídico, não havendo amparo para a aplicação de quaisquer sanções e penalidades em caso de descumprimento da solicitação.
Por derradeiro, cumpre ressaltar ser inafastável a responsabilidade civil do estabelecimento de saúde, no papel de prestador de serviços, em caso de intercorrências ou danos advindos de contratos firmados sem registro e anotação de responsabilidade técnica, o que, porém, não o coloca sob a fiscalização de Conselho Profissional alheio a sua atividade básica, devendo eventuais responsabilidades serem apuradas em sede judicial.
Com efeito, a observância de normas técnicas para execução de obras nas dependências da instituição de saúde é de máxima importância, mas a tarefa deverá ser exigida dos profissionais e empresas cuja atividade básica exercida se enquadre entre as especialidades reguladas pelo CREA/MG.
Dra. Letícia Agostinho Mouro
OAB/MG nº 200.984