Heterointegração do direito comercial
Uma das qualidades que distancia o Direito Comercial de outras disciplinas jurídicas mais herméticas em relação a seus preceitos é a sua concepção eminentemente histórica.
Dotadas de feição plástica e construídas pela constante evolução das práticas comerciais, muitas das normas mercantis sugiram por via da estabilização de usos e costumes, unanimemente aceitos por seus usuários.
Nesse sentido, em que pese a legislação comercial ser o arcabouço fundamental de todo o regramento aplicável às relações privadas de natureza empresarial, é sabido que muitas das normas mercantis não foram forjadas pelo desejo legislativo de se estabelecer uma determinada prática, mas antes por assimilar aquilo que se praticava e que não mais seria possível contestar enquanto costume irrenunciável dos comerciantes.
Além disso, em muitos casos a própria legislação não alçou dar uma precisa conceituação a determinados institutos ou sequer lhes deu atenção devida, restando nesse vazio dogmático a oportunidade das partes estabelecerem criativamente os conceitos e soluções que melhor lhes atendessem.
Contudo, sabedor dessa imperfeição fulcral, o legislador não deixou de prever formas de se estabelecer conceitos e regras particulares para quando a ausência legislativa for a causa da dúvida insuperável.
Tal premissa que permeia todo o Direito e que lhe retira o contorno idealizado de suposto universo autointegrador ou sistema jurídico fechado, teve a louvável ressalva do art. 4º, do Decreto Lei 4.657/1942.
Assim, quando houver situações em que a fonte primária da norma, ou seja, a lei, não oferecer a resposta correta para determinada situação específica, servirão as fontes secundárias de normas (dentre as quais temos a analogia, _os costumes_e os princípios gerais de direito), como resposta ao caso.
Especificamente tratando aqui dos costumes, e retomando ao cerne do assunto (heterointegração), encontramos no direito comercial a disciplina que mais se nutre dessa fonte para estabelecer práticas e normas que paulatinamente vão sendo incorporadas ao sistema legislativo do país.
Nesse sentido, seja quando inova-se na elaboração de um contrato atípico, seja quando se estatui uma cláusula de conteúdo econômico-financeiro com racional próprio para interpretação e aplicação, seja quando as partes definem a melhor interpretação ou sentido de textos na forma do art. 113 do Código Civil, temos aí o melhor exemplo de pequenas e contínuas evoluções a que se submete diuturnamente nosso direito e que, se preservadas, legarão sempre nova tecnologia ao sistema normativo existente.
Portanto, por ser o Direito Comercial um ramo de atuação onde se imbricam várias disciplinas (econômica, financeira, contábil, etc), inevitável que a atuação do advogado se paute primordialmente por construir respostas que se alinhem ao plano jurídico existente, aplicando-as com vistas na melhor coerência possível.
Contudo, as qualidades de uma assessoria jurídica especializada exigem do advogado da área empresarial o preparo para inovar no fértil plano jurídico do inexistente, oferecendo respostas diversas para situações diversas; lugar onde a sabedoria impõe respeito à legalidade, sem prejuízo da criatividade.
Dr. Homero Gonçalves
OAB/MG 99.915