A partir da leitura do título do texto, destacam-se três palavras que podem soar incomuns àquelas pessoas mais ligadas aos jargões e brocardos jurídicos mais tradicionais. Portanto, antes mesmo de explicar como esses três conceitos se conjugam e interagem com o dia a dia do Direito contemporâneo, vamos às suas breves descrições. São elas: Discovery, preditivo e Tribunal Multiportas.
O procedimento de Discovery, guardadas as devidas proporções, é uma espécie de produção antecipada de provas. Trata-se de um procedimento do Direito norte-americano que consiste numa das fases pré-processuais (chamado de petrail), em que uma das partes que defende possuir um direito potestativo protocola um requerimento no Tribunal – o chamado pleading – para que uma espécie de troca-revelação de provas e dados seja conduzido pelos advogados das partes e por uma espécie de oficial de cartório, incumbido de dar oficialidade ao ato, além de cuidar da isonomia entre as partes e da confidencialidade das informações.
Ainda que comparado ao nosso processo antecedente de produção antecipada de provas, o Discovery é eminentemente pré-processual, já que não está atrelado a um nº de processo, não cria prevenção a nenhum Juízo para uma propositura de uma ação futura, não exige uma citação formal da outra parte, tampouco possui todas as burocracias da jurisdição, como prazos peremptórios, pagamentos de custas, emolumentos etc.
Sobre o termo “preditivo”, ele está intrinsecamente ligado à nova sistemática processual do Direito Civil brasileiro, pois o novo modelo ampliou o protagonismo dos chamados “precedentes”. Ainda que precedente e jurisprudência, tecnicamente, não se confundam, a bem da verdade é que ambos lançam foco sobre pesquisas e filtros de decisões judiciais similares ao caso concreto que se deseja submeter à jurisdição.
Essa pesquisa do “comportamento” passado de um Tribunal, de uma Câmara, Turma, Plenário, magistrado, desembargador ou ministro tem um objetivo preditivo – uma importação do Law and Economics de Harvard – , isto é, uma tentativa de prever quais as chances de determinado Juízo decidir desse ou daquele jeito, ou seja, qual o percentual de risco na propositura de uma demanda, sob determinada causa de pedir, subsumida a determinada fundamentação jurídica, a ser distribuída em determinada Comarca e dentre tantas outras variáveis que, no conjunto da obra, representam o que os juristas brasileiros denominaram de jurimetria.
Sobre o terceiro conceito, também introduzido pela nova sistemática processual do Direito Civil brasileiro, diz-se Tribunal Multiportas para se referir às múltiplas alternativas de solução de um conflito que não sejam necessariamente a jurisdição. Assim, o novo modelo do Judiciário busca uma maior personalização do modelo de soluções de controvérsia, na medida em que oferece ao jurisdicionado e aos operadores do Direito soluções diferentes de uma ação judicial propriamente dita.
Dentre as opções de solução de controvérsias pelo Tribunal multiportas existem aqueles que são as autocompositivas e aquelas que são as heterocompositivas. Autocompositivas são aquelas em que as partes, sozinhas ou com a facilitação e intervenção de um terceiro neutro, constroem a solução. Os exemplos mais tradicionais são a mediação, conciliação, negociação, ODRs. Já as heterocompositivas são aquelas em que a intervenção de um terceiro decide a controvérsia, seja através da aplicação da lei, seja através da aplicação de um conjunto de normas previamente acordado entre as partes, seja através de um laudo, relatório ou parecer técnico-científico. Os exemplos são a jurisdição, a arbitragem e o dispute board, respectivamente.
Uma vez apresentados os três conceitos, cumpre agora demonstrar que a interação entre eles, desde que promovidas com profissionalismo e experiência profissional, pode entregar ao cliente um aumento potencial de eficiência na busca de seus direitos, uma redução significativa de custos e risco processual e, finalmente, um encurtamento dos caminhos processuais, o que no final e ao cabo significa a redução do tempo de tramitação.
O primeiro passo está ligado ao Discovery: é cuidar do levantamento valorativo das informações, dados e provas, garantindo que elas não só estejam disponíveis, mas que também estejam organizadas, destacadas, catalogadas (aplicação de legal design e visual law), transformadas em documentos oficiais (como é o exemplo da Ata notarial), submetidas à simulações de contraditórios (depoimentos simulados em formato media training).
O segundo é ligado à Análise Preditiva: é necessário levantar todo esse escopo probatório e submetê-lo seriamente às pesquisas de precedentes e jurisprudências que, por sua vez, tenham julgado casos concretos semelhantes ao caso do cliente.
O terceiro e último ponto é a verdadeira utilização do Tribunal Multiportas: antes de conduzir o cliente para o lugar comum do Judiciário, é necessário se valer das ferramentas alternativas de solução de conflitos, inclusive com os métodos escalonáveis de controvérsias, geralmente sob o uso sucessivo de notificação extrajudicial, negociação, conciliação ou mediação, arbitragem ou dispute board, produção antecipada de provas, alguma medida preliminar judicial, e só então a jurisdição tradicional.
Os Tribunais de MG, RJ, SP, ES, RS e tantos outros do país já possuem resolução que dispensa a designação de audiências de conciliação ou mediação judicial para os casos em que as partes comprovem que houve tentativa pré-processual dessas autocomposições. Alguns Tribunais inclusive aplicam desconto nas curtas iniciais. No final das contas, mesmo que as tentativas alternativas não importem na solução integral do conflito, ainda assim, todas as partes envolvidas iniciarão o processo com plena ciência da matéria controvertida, do comportamento das partes e das provas que cada uma possui, o que importa numa elevação de valor e de técnica no processo, evitando atos desnecessários e procrastinatórios.
Dr. Guilherme de Castro
OAB/MG 154.693