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O Direito Recuperacional como resposta à crise

Qualquer análise que se faça do cenário econômico atual deixa lacunas sobre os verdadeiros impactos do coronavirus (COVID-19) nos mercados ao redor do mundo e gera incertezas sobre suas repercussões numa economia globalizada, já combalida pelos efeitos conjunturais de políticas macroeconômicas recentes, produzidas por disputas geopolíticas.

Infelizmente a turbulência nos atinge em um momento em que as teses de investimento festejavam um possível crescimento advindo da combinação de fatores como juros baixos, reformas estruturais em curso, capacidade ociosa da indústria e desvalorização cambial.

Fatalmente, choques decorrentes de situações econômicas extremas como essas produzem efeitos que se arrastam por longos períodos, além de comprometerem o investimento dos empresários e a renda dos trabalhadores, atingindo tanto o lado da oferta, quanto o lado da demanda.

Num primeiro momento, os sinais econômicos que advêm de fatos com rápida absorção do mercado já repercutiram nas bolsas de valores ao redor do globo, mas fatalmente também assombrarão por longos períodos alguns outros mercados relevantes, como dos detentores de títulos de dívidas, que têm os impactos retardados pela demora na produção de indicadores seguros.

Apesar do anúncio de que tempos difíceis estão por vir, a prudência na adoção de boas estratégias permite que muitos contornem todos esses obstáculos. Para isso, é comum ao empresário habilidoso e experiente dispor de instrumentos jurídicos para minorar os efeitos deletérios de uma eventual crise duradoura.

Dentro do campo específico do Direito Recuperacional, a Lei 11.101/2005 trouxe ao país o instituto da Recuperação Judicial e Extrajudicial de empresários e sociedades empresárias, concedendo meios de reestruturação àqueles que eventualmente forem atingidos por crises econômico-financeiras.

Dotada de inúmeros mecanismos de proteção dos credores, assim como de resguardo do devedor, a Lei Recuperacional baseia-se em princípios de preservação da empresa, tratamento isonômico dos credores, manutenção da fonte produtiva e dos empregos dos trabalhadores, tendo como mote a superação da crise econômico financeira do empresário.

Aqui em breve resumo meramente didático, tem-se que, a partir de um pedido justificado e da concessão do direito à Recuperação Judicial, o empresário submete-se a um regime concursal que visa a organização das regras para o pagamento dos débitos devidos aos credores, admitindo-se nesse caso condições excepcionais e prazos diferidos.

Sem se afastar de suas atividades regulares e com as dívidas suspensas pelo prazo de 180 dias (stay period), o empresário em Recuperação Judicial deverá organizar-se de forma a demonstrar aos credores a viabilidade de seu Plano de Recuperação, o qual, se aprovado, deverá ser rigorosamente seguido e acompanhado pelo Administrador Judicial e Comitê de Credores.

Há de se destacar que, apesar de servir ao propósito de controle dos atos praticados pelo empresário submetido ao regime recuperacional, o Administrador Judicial em momento algum assume o controle da empresa, resumindo-se a sua atividade fiscalizadora dentro daquilo que expressamente está previsto na Lei 11.101/2005.

Dessa forma, após superada a fase inicial desse procedimento que contempla a verificação, impugnação e confirmação do exato montante do débito – compreendido por todos os débitos, ainda que não vencidos ao tempo do pedido- e uma vez consolidado o quadro geral de credores homologado pelo juízo universal, terá o empresário, segundo a LFRE, o prazo de 60 dias para apresentar seu Plano de Recuperação, em Assembleia marcada para tal fim.

Dentre as inúmeras hipóteses de modelos estruturais de recuperação, a própria LFRE, em seu art. 50, previu alguns meios para viabilizar o soerguimento do empresário. Nada obstante essas modalidades expressas, porém, consideradas as variegadas formas jurídicas e estratégias financeiras existentes, mostra-se conveniente avaliar caso a caso qual planejamento que melhor se adequa à situação, ao mercado e à estrutura corporativa do empresário em recuperação, visto ser possível criar estratégias na contempladas na Lei.

Enfim, apesar das crises permitirem respostas como as que são oferecidas pela Legislação, a experiência mostra que em muitos casos o atraso do empresário na procura por uma saída efetiva baseada na legalidade impede que sejam alcançados resultados satisfatórios, sendo certo que uma assessoria jurídica e econômico-financeira são fundamentais para saber o momento ideal para tomada dessa decisão em tempo de salvar o negócio.

Homero Gonçalves
OAB/MG – n° 99.915

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