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Telemedicina: Desafios Jurídicos e Oportunidades

Por possibilitar a assistência em saúde de maneira remota, mediante a utilização de ferramentas interativas de comunicação audiovisual e de dados, a Telemedicina ganhou notoriedade durante a pandemia da Covid-19. Inquestionavelmente, a realização de consultas e cuidados médicos à distância contribuiu para repensarmos a forma de prestação de serviços na área da saúde, sobretudo em relação às inúmeras oportunidades e desafios que circundam o tema.

Chao Lung When, Professor Associado e Coordenador Geral da Disciplina de Telemedicina da Faculdade de Medicina da USP, ressalta os benefícios da utilização das modernas tecnologias de comunicação para a prestação dos serviços médicos, afirmando que “uma das principais potencialidades da Telemedicina é sua capacidade de aumentar os relacionamentos de confiança entre profissionais de saúde, pacientes e seus familiares”. Nesse sentido, defende que os sistemas de saúde, públicos ou privados, possuem a oportunidade de universalizar a prestação dos serviços através das ferramentas de comunicação, garantindo o monitoramento contínuo e a prevenção de doenças, com efetivo acompanhamento domiciliar.

As operadoras de planos saúde, por sua vez, também podem ser beneficiadas pela cobertura dos serviços prestados através da Telemedicina, na medida em que a cobertura dos procedimentos representa um diferencial competitivo em seus portfólios e, em última análise, contribui para a qualidade e otimização do cuidado em relação a seus beneficiários.

Por outro lado, vislumbra-se que o avanço da Telemedicina no Brasil e a manutenção dessa ferramenta pelos profissionais da saúde dependem da superação de desafios éticos e jurídicos, reflexos da ainda incipiente regulamentação existente sobre a atividade.

A própria evolução normativa do tema pelo Conselho Federal de Medicina demonstra que há grandes controvérsias. Do ponto de vista ético, a Telemedicina foi regulamentada pela primeira vez no Brasil em 2002, por meio da Resolução nº 1.643/2002 do Conselho Federal de Medicina (CFM), que fixou breves orientações para o seu exercício, autorizando apenas o suporte diagnóstico e terapêutico por médicos que emitem laudos à distância, em casos de emergência ou quando solicitado pelo profissional responsável pelo paciente.

Apenas em 2019 foi publicada a Resolução CFM nº 2.227/18, que buscou prever efetivos critérios para a prática no país, autorizando e regulamentando a prática da Teleconsulta (consulta médica remota), importante vertente da Telemedicina. Contudo, em razão do significativo número de propostas para alteração por entidades de saúde de todo o país, referida normativa foi revogada pouco tempo depois de sua publicação, sendo a antiga Resolução CFM n.º 1.643/2002 reestabelecida.

Em que pese o retrocesso normativo, com a eclosão da crise sanitária causada pelo Coronavírus no ano de 2020 e a inafastável necessidade de distanciamento social, mostrou-se imprescindível a adoção de medidas para regulamentação da Telemedicina em caráter emergencial. Não por outra razão foi editada a Portaria nº 467 do Ministério da Saúde, que, em consonância com a Lei nº 13.989/20, autoriza temporariamente os procedimentos médicos à distância no Brasil.

Nessa toada, também foram constatadas importantes deliberações em âmbito regulatório. A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), por meio da Nota Técnica Nº 7/2020/GGRAS/DIRAD-DIPRO/DIPRO, recomendou à Diretoria Colegiada do órgão que se posicione a favor da cobertura obrigatória de qualquer teleconsulta médica, não sendo necessária a atualização do rol das coberturas obrigatórias às operadores de plano de saúde, previsto pela RN nº 428/2017 (ANS).

Por conseguinte, evidencia-se que o cenário de crise causado pela Covid-19 impulsionou a implementação da Telemedicina na prática diária dos profissionais de saúde, sendo inquestionável a tendência de manutenção das ferramentas na prestação de serviços médicos, notadamente para a realização de Teleconsultas. Outrossim, em razão das controvérsias supra abordadas, é necessário que reconheçamos a importância da regulamentação da prática, do ponto de vista ético e legal, para além da situação emergencial de crise causado pelo vírus da Covid-19, consolidando de forma permanente a utilização das ferramentas interativas na realização de procedimentos médicos.

Por óbvio, ressalta-se que a regulamentação implica na construção de parâmetros éticos e limites jurídicos para a Telemedicina, sendo fundamental a adoção de cuidados, tais como a exigência de prévia autorização do paciente por meio de um termo de consentimento informado, livre e esclarecido; a realização de telediagnóstico apenas por médico especialista; o zelo no tratamento de dados pessoais dos pacientes, dentre outros.

Em síntese, é primordial que a legislação acompanhe as mudanças e o desenvolvimento das tecnologias aplicáveis à área da saúde, identificando dificuldades, falhas, riscos e propondo soluções éticas e jurídicas para a utilização e aprimoramento da Telemedicina. Trata-se de debate de suma relevância, que não pode ser mais adiado.

Fonte:

CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Define e disciplina a telemedicina como forma de prestação de serviços médicos mediados por tecnologias. Resolução n. 2.227, de 6 de fevereiro de 2019. Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/resolucoes/BR/2018/2227. Acesso em: 03 set. 2020.

CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Define e disciplina a prestação de serviços através da
Telemedicina. Resolução n. 1.643, de 26 de agosto de 2002. Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/resolucoes/BR/2002/1643. Acesso em: 03 set. 2020.

When, Chao L. Telemedicina e Telessaúde valorizam a humanização da relação entre profissionais de saúde, pacientes e familiares. Disponível em: http://chaowen.med.br/artigos/telemedicina-e-telessaude-valorizam-a-humanizacao-da-relacao-entre-profissionais-de-saude-pacientes-e-familiares/. Acesso em: 04 set. 2020.

Dra. Letícia Agostinho Mouro
OAB/MG nº 200.984
Valdemir Souto

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